sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

Meu par oculto... prisioneira num grito...mudo...

Desencontros…
Quando todos estão de regresso a casa, eu estou de saída…
Para me encontrar de novo contigo…
Chego á hora marcada como sempre…
Horas tardias, finais de tardes, começos de anoiteceres…
Estâncias vazias, sem gente…
Compartimentos atulhados de silêncios…
Ambientes discretos, mas densos que se estilhaçam com ruídos fugazes…
Silêncios, que em breve meus suspiros e lamurias quebraram…
Desempenharei o papel de obtusa, onde recitarei, monólogos intermináveis…
Pois tu, jamais me contestas…não possuis o dom da palavra…
Tenho já impressa, na memória de outras noites, a tua conversa muda…
Esperas-me para te libertar…
És o esqueleto no armário secreto…
_ Estou farta de ti, sabes? Qualquer dia deixo-te ai, abandono-te!
Ameaço deixar-te á mercê de outras mãos que te queiram…
Tenho as minhas mãos já cansadas, calejadas de te segurar com firmeza e habilidade nesta dança, no lusco-fusco, longe de olhares terceiros…
Contenho decência nestas obrigações, que reparto contigo, mas não gosto de ti…
Já te disse vezes sem conta nestas palavras enfurecidas, que te lanço sem dó, porém não entendes, estou farta de ti…
Mas bailo contigo esta última dança…
Digo última, mas sem fim á vista…
Abandonas teu corpo rígido, nos meus braços confiante…
Numa postura hirta começamos…
O palco esse cenário gasto, é só nosso…
Ninguém nos faz companhia nesta dança miserável…
Percorremos cada recanto com perícia...
Ai de nós, ai de nós, se houver amanhã, vestígios visíveis de nossos passos, deste hoje que temos de apagar…
Só tu e eu…
E a música a tua preferida, sempre igual, extenuante música…
Dançamos sôfregos, em simultâneos passos ensaiados pela força do hábito…
Sorves-me as vontades, no tempo que escasseia…
_ Não gosto de ti, sabes? Digo-te isto, com o tom mais rude que possuo…
Mas não me escutas, entoa só o som da tua ensurdecedora valsa…
Nada mais se ouve senão o som da nossa cumplicidade…
Sugas de mim com pujança, as ultimas forças de um dia cansado e gasto…
Tenho os tímpanos doridos, enfadados desta maléfica melodia que é tua…
Porém se repete sem mudança todas as noites…
Dilacerante sina…
Segues meus gestos sem negar, submisso…
Nesta dança desprezível, em que preferia não ser teu par…
Obediente malvado e frio, persegues-me rígido continuamente…
Abraças-me com correntes traiçoeiras que soltas de ti, e te oferecem movimento…

Só eu e tu...

Ébrios semblantes…
Desequilibro-me, um derradeiro rodopio…
Acabou…por hoje chega… já não suporto mais…
Desfaleces, pois soltei o cabo que te prendia a mim…
Prossigo com a convicção de ter dado o melhor de mim, sobriamente…
Sem algum som agora…
Só os meus sussurros discretos mudos, á tua surda quietude…
_ Não gosto de ti, já te tinha dito, sabes disso? Odeio-te!
Encarcero-te outra vez esqueleto, infame nesse armário oculto…
Fecho a porta rodo a chave, e grito-te já do lado de fora:
_ Até amanhã, á mesma hora…
Para mais uma dança não digna de mim...



(primeira foto, olhares.com)

1 comentário:

  1. Tua voz grita à beira do silêncio, dos gestos sem emoção, inertes, cansados da rotina. Não há alquimia, nem vontade, nem amor... apenas um patíbulo!...

    Beijos!...
    AL

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